«No Legitimismo político articulavam-se o espírito contra-revolucionário e o tradicionalismo. Defendia-se nele a unidade do poder político que, detendo a suprema capacidade arbitral, garantia o equilíbrio e a coesão dos corpos sociais. Persistia uma concepção social de corpo, em contraposição a uma outra fundada na cidadania; isto é, a percepção do poder político e de sociedade por parte dos legitimistas opunha-se ao conceito e à prática da soberania nacional, que se exercia através de pessoas e grupos políticos sancionados pelas mediações eleitorais. Tratava-se, pois, de uma posição distanciada do sistema representativo, não por um simples retorno ao passado, mas pela alegação de uma outra percepção sobre a liberdade e sobre a função da chefia do Estado.

A derrota Miguelista e o exílio de D. Miguel tinham originado uma referência, com traços messiânicos, de resistência anti-liberal quer no respeitante aos aspectos políticos mais institucionais, quer naqueles traços mais quotidianos das medidas governamentais sobre determinadas matérias. A esta atmosfera anti-liberal juntara-se também o problema da obediência eclesiástica que, no contexto do «cisma religioso», provocara níveis importantes de reacção e resistência popular, onde a dimensão política se conjugava com a formulação da vivência religiosa local, questionadora da legalidade e da legitimidade constitucional e concordatária da Igreja Católica.»
in, António Matos Ferreira, ‘Um Católico Militante Diante da Crise Nacional – Manuel Isaías Abúndio da Silva (1874-1914)’, editado por Centro de Estudos de História Religiosa, Universidade Católica Portuguesa.